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quarta-feira, 2 de junho de 2010

A memória

Odete Soares Rangel


Memória é uma palavra muito abrangente quando não delimitada, eis que pode possibilitar leituras diversas. Referindo-me a ela, posso falar de armazenamento de informações e imagens; de lembranças; de doenças mentais; de monumentos para comemorar os feitos de alguma pessoa ilustre, ou algum sucesso notável ou até mesmo de uma dissertação, na qual uma pessoa relate suas memórias, entre outras abordagens.

Meu foco é a memória como fonte de armazenamento de informações. Desde criança nós vivenciamos situações negativas e positivas que ficam gravadas na nossa memória para sempre. Passamos a vida inteira tentando esquecer as negativas e livrar-nos delas, mas certo dia sem que queiramos, elas voltam à mente, nos provocam, ativam nossas iras, lembram-nos dos nossos erros, nos fazem sentir culpados por algo. As coisas positivas nós guardamos na memória e no coração, fazemos questão de contar para as outras pessoas, pois são momentos de alegria que relembrados nos acalentam a alma e alimentam o espírito. Eu recordo com muita alegria minhas roupas de infância, minhas bonecas de pano, os pães especiais que minha mãe fazia para cada um de seus doze filhos, da nossa fazenda, da cachoeira, de andar a cavalo, da natureza exuberante, dos presentes de Páscoa, do dia das crianças, do Natal e Ano Novo, dos carinhos que eu recebia. Até dos castigos tenho saudades, pois eles me fizeram evoluir como ser humano. Em adulto não foi diferente, foram muitas conquistas no campo profissional ou pessoal, enfim vivi muitas emoções. Vivi muitos amores, viajei e estudei muito, desbravei espaços que eram quase impossíveis para uma mulher naquela época, todas essas coisas muito me orgulham e as retenho na memória. Mas, também, lembro de coisas tristes na fase adulta, as quais tento esquecer, mas elas sempre me assombram. Como a maioria dos poetas, minha vida é marcada pela morte: meus avós, meus tios, meus sobrinhos, meus pais, meus irmãos e muitos amigos. Isto sempre me faz sentir culpada, é como se eu tivesse falhado na minha missão por não tê-los salvo. Fico atônita quando olho para trás e penso que eu poderia ter agido diferente em determinadas situações, quão imatura eu me revelo hoje nas tomadas de decisões em algumas situações em épocas longínquas.

Enfim, não sou Deus; se eu falhei como ser humano, não posso me crucificar ou apagar essas vivências da minha memória. Esta é para nós o que queremos que ela seja, se quisermos viver bem hoje precisamos nos libertar do ontem. As pessoas não vivem de lembranças passadas, nem de expectativas futuras, mas sim de ações no presente. Minha memória é um composto de todas essas coisas sobre as quais discorri, mas eu estou feliz de tê-la e poder exercitá-la não só para armazenar as coisas do passado, mas também as do presente, ao passo que muitas pessoas, por inúmeras razões que não cabe aqui discutir, foram privadas dessa bênção.

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